segunda-feira, 23 de abril de 2012

Bolo de nozes


Bate bate bate com o martelinho a noz para fazer algum doce para o natal bate bate bate bate batemos batemos a mão pega o cabo com força o pulso forte os dedos envolvendo o cabo suando pensamos nos parentes que mais tarde estarão aqui em casa trazendo seus presentinhos comprados em camelôs por menos de dez reais quebra a casca continua batendo com o martelinho atingindo o chão tac tac tac tac tac pega uma pedrinha do lado bate nela pensando no passarinho que queríamos ter em criança no brinquedo que não ganhamos no aniversário queremos quebrar tudo com este martelinho tac tac tac nossas mãos estão doendo mas continuamos batendo batendo batendo alguém chamando no portão ei ei alguém o pote tem mais vinte nozes por quebrar mas partindo esta pedra é prazeroso triturando a pedrinha triturando o chão da varanda algumas partículas dela atingindo os olhos a boca não importa presentinhos presentinhos tac tac tac que importa serem onze horas que importa se o fogão está aceso que importa tac tac calor infernal sede não quer ir à cozinha não quero não quero deixá-la tac tac tac é minha mão este ferro sede sede água pedrinhas nozes bolo por fazer refrigerante congelando na geladeira os filhos com fome chorando jogando vídeo game vendo filme pornô na internet ainda chamam no portão inferno vai se tac tac quero comer vem logo fazer a comida pede pra sua tia as horas no quarto de castigo as horas passando rapidamente daqui a pouco vão chegar não vou abrir não quero ninguém aqui em casa nunca quisemos será diferente levantamos martelamos a parede quebramos o vidro da janela da sala os vizinhos da frente nos olhando o que têm a ver com isso não pagam minhas contas tomem conta da vida da sua filha que é uma cachorra que dá pro namorado sem vocês verem cuidem da vida do seu filhinho que acessa sites e conversa com um pedófilo quebro mais quebro martelamos martelamos martelamos as mãos vermelhas nosso rosto animalizado os olhos de raiva fúria range fortemente os dentes por descuido mordemos a língua merda merda bate mais forte nas paredes e nos vidros com o martelo chuta o pote com as nozes gritando xingando não deixar não deixar continue martelando continuemos mas temos que fazer o bolo com nozes para a noite natalina em que passará feliz com os familiares que todos os anos trocaremos presentes comeremos o frango assado sempre cada um traz um prato uma bebida assim assim quinze anos faz o bolo delicioso e aplaudido de nozes nozes compradas no mesmo supermercado quinze anos quinze anos batemos mais forte nas paredes as crianças olhando chorando gritando porque aquilo porque já pra dentro já agora vão fazer o que têm que fazer sempre sempre assim o martelinho se desgastando pelas batidas constantes as mãos com bolhas sangrando passando aquilo tudo mas ainda batemos forte tomar banho depois juntamos as nozes descascadas trituradas as pedrinhas para fazer o delicioso bolo de nozes


Gabriel Sant’Ana

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Praça dos sobreviventes

Saindo do portão gradeado e alto da escola, há uma praça que fica em frente, a uns dois metros, de uma igreja que abre às seis da manhã, cu...