osculum si sumat os ab ore
Carmen 78
Vulnerável tornei-me
teus olhos me acertaram
e fico de desejos ferido
Uniria ao teu o meu corpo
em deliciosos laços delicados
e de dois faria um só coração
Um só querer enfim seria
Um só cuidar enfim seria
Enfim teria
Teu amor me fez cativo
e me obriga a duros pesares
............................................
Vem logo, vem
e me cura desta azia
que me queima o estômago
que me entope o peito
que me não deixa a mim
De tudo fiz
De nada adiantou
Doril, chá de boldo
água benta, oração
a são Brás
Ah! que bom seria
se recebesse beijos de tua boca
se os tomasse num virar de rosto
se os ganhasse como prêmio
Ai! Vênus propícia, atendei
atendei a mim suplicante
de suplícios castigado!
Ai! Me escutai!
Fazei que ela me olhe
que esteja disponível
neste dia de angústia!
Já agora acendo velas,
deixo ao chão cigarros acesos,
oferendas na esquina da rua dela.
Ao passar seja agradável a vós,
confiante vos oferto!
Gabriel Sant'Ana
sexta-feira, 30 de novembro de 2012
segunda-feira, 26 de novembro de 2012
Da mulher do “jardineiro”
A retórica do
jardineiro entre motivos que nem ele sabe quais sejam, por piores que fossem as
palavras ou atos da mulher do narrador dessa história, ele não poderia, sequer
deveria, ter trocado sua própria mulher por uma planta, mesmo que esta fosse a
mais bela de todas.
Eis aqui a retórica
da mulher do jardineiro.
Se é que alguma vez
houve uma retórica do tal jardineiro – que por sinal não demonstrou muito
talento para as construções sintáticas e estilísticas que deveria saber e
dominar, visto ser ele um advogado, conhecedor de técnicas discursivas complexas
com finalidades não muito francas ou respeitosas.
Lembro-me agora,
remexendo minhas coisas, minhas gavetas, tendo encontrado um poema que me tinha
escrito por ocasião do nosso quinto aniversário de casamento; lembro-me agora
dos péssimos modos que tinha quando lhe pedia, atentem-se ao fato, quando lhe
pedia que fosse comprar pão para nosso café da manhã nas tardes de sábado. Respondia-me
que não lhe caberia fazer aquilo, pois aturava todos os dias filas enormes nos fóruns
da cidade indo de lá para cá com papéis e mais papéis de processos que pareciam
não ter fim e, tanto trabalho, para não ganhar quase nada – assim me dizia.
E dava desculpas
atrás de desculpas, até que eu me cansava e ia eu mesma comprar o bendito pão;
pão este que ele comia com grande alegria, quase todos ele comia.
E quase sempre era a
mesma maneira de falar, pouco gesticulava, muitas vezes gaguejava, é fácil
notar isso, pois ele a todo momento faz pausas e intercala frases a fim de
conseguir um tempo para recobrar o fôlego. Era insuficiente e irrisória em sua
técnica oratória. Agora me lembro.
Se houve alguma
forma que busquei para que ele desistisse do nosso relacionamento? Talvez. Houve
um dia em que estava na feira e me deparei com uma bela rosa. Em nosso quintal havia, naquela época, poucas
plantas. Rosa bela, amarela, e mais brilhante quando um raio do sol lhe tocou
as pétalas. Fui tomada de uma forte sensação que me fez comprar aquela rosa.
Não faço aqui
grandes inversões ou divagações; apenas minha memória e o que vivi; não quero
me estender para não ser cansativa; não quero igualar-me ao seu estilo.
Houve uma forma, um
dia em que foi mais que necessário livrar-me daquele fardo. Leio agora meu
diário – neste dia mesmo fiz algumas rápidas anotações.
Noite. Preparei uma
deliciosa comida, arrumei a sala. Preparei o ambiente. Propício. Vesti-me
conforme a ocasião. Velas. Incenso. Perfume. Creme para pele. Não seria para
livrar-me, mas para prová-lo.
Não me
correspondeu. Levara para a mesa um esquisito vaso no qual, segundo ele, havia
uma semente de uma planta da qual ele iria cuidar com exclusiva dedicação.
No dia seguinte
suas malas estavam prontas – tive o desprazer de fazê-lo com minhas próprias
mãos durante toda a madrugada. Ele não quis aceitar, tentou inclusive me
agredir, mas estava eu munida de vassoura e ferro quente, não ousou levantar as
mãos contra mim. Só tive estas palavras para ele: Vá cuidar desse vegetal longe
de mim; já estou dando início à nossa separação e já mudei meu status no Facebook. Adeus!
Gabriel Sant'Ana
terça-feira, 20 de novembro de 2012
1º Cantar
Teus lábios mais
doces que o mel
Tuas mãos mais
suaves que a brisa da manhã
Teus pés mais
delicados que a água do rio
Toca-me com
suavidade
E me explodo de
amor
Contorço-me de
paixão
Vendo teu corpo
Deslizar-se no meu
Foram sete
E mais um dia e
uma noite
Em que me deste
teus dons
E me saciaste os
desejos
Quatro coisas são
preciosas em ti
Teu rosto fonte
de toda beleza
Tuas palavras
Mais sábias que
todos os Provérbios
Tua fidelidade
equiparável a uma deusa
Tuas mãos
dedicadas em dar-me
Os mais carinhosos
afetos
E uma quinta
supera as demais
A tua própria
existência
Gabriel Sant’Ana
sexta-feira, 16 de novembro de 2012
"Meu táxi - um divã"
Faltam alguns dias para o lançamento do livro de Paulo Cesar Martins, "Meu táxi - um divã", do qual tive o prazer de fazer a revisão e a sinopse.
Não quero aqui fazer outra, ela pode ser lida, inclusive, no site que o Paulo criou: http://paulocesarj.wix.com/meutaxi#!untitled/mainPage.
No entanto, aqui quero deixar algumas palavras sobre esse livro e meus agradecimentos pela confiança que teve o autor em pedir que eu revisasse seus escritos e depois lhe escrevesse a sinopse.
Se os leitores ainda não conhecem o Paulo, adquiram seu primeiro livro "20 anos de praça. Crônicas de um taxista". São histórias curtas e engraçadas, rápidas como uma viagem de táxi, e prazerosas!
Mas, no segundo livro, temos, mais do que cenas engraçadas e rápidas, uma reflexão maior sobre questões humanas, que se passam no Rio de Janeiro, mas que, posso dizer, poderiam ambientar-se em qualquer parte ou em qualquer cidade: são aflições, perdas, histórias de superação, desabafos; além disso, percebo uma maior elaboração na escritura, no desenvolver das narrativas, tal como a relação temporal em que narra fatos num passado perfeito mas algumas vezes dando maior vivacidade usando o presente; ou mesmo questões discursivas como o uso de diálogos ou o discurso indireto livre, ou ainda as opiniões do narrador que se percebem leves durante o narrar.
Perceberão os leitores outras coisas que não cabe aqui comentar.
Ficam aí minhas palavras.
Gabriel Sant'Ana
segunda-feira, 12 de novembro de 2012
Desencontro na manhã de segunda
Quente cubículo público. Odor de
cloro. Chão molhado. Primeiro a entrar naquele dia. Fecha a porta. Grande. Como
sendo reservado a cadeirantes.
De fato deveria ser assim para
todos os tipos de tamanho. Mas via que não caberia ali cadeirante algum.
Via apenas aquele espaço pequeno e
o buraco que salvaria o sufoco das contrações perturbadoras a que todos estão
sujeitos seja pela manhã, tarde, noite, madrugada, na hora do sexo, nos minutos
iniciais de uma prova de concurso, na igreja, no parto, nos parabéns, no
enterro. Desfivela o cinto, abre a bermuda, abaixa o zíper, retira a bermuda, a
cueca, a blusa polo azul. Coloca os pertences ao lado esquerdo; do outro, há a
lixeira. Agacha-se, é sabido ser perigoso sentar-se, o risco de uma doença
infecciosa, sustenta-se com as pernas, posição adorável de um penitente
resignado em expurgar seus pecados com um verdadeiro e puro sacrifício.
Interessante notar seu rosto
aflito, não por aqueles incômodos, mas de uma vexaminosa vergonha caso entre
ali alguém para usar o outro espaço para, talvez, já que é preciso estar atento
às chamadas dos servidores tão aplicados em distribuir senhas, lavar as mãos
sujas de segurar no ferro imundo de um ônibus lotado às cinco da manhã vindo da
Taquara, Freguesia, Cidade de Deus, Vila Valqueire.
Bastou entrar fechar a porta
retirar rápido a roupa jogar ao chão distante da lixeira agachar-se rapidamente
contraindo os músculos ir verificando abaixo de si caso algo escapasse pelas
bordas ou fosse pelas pernas ou nos pés observando contraindo a barriga
expelindo esguichando esvaindo saindo em jatos fortes constantes contra a água
borrando enegrecendo todos os cantos tomando o mal cheiro
indo a limpeza do
cloro sabão que antes o funcionário contratado salário atrasado havia feito
dedicado agradecendo em preces o trabalho digno não fazendo sequer um único
jato de mijo
mal cheiro fezes
líquidas: bem-estar aliviado do transtorno gerado pelo trabalho de digerir
pizza refrigerante cervejas churrasco torta bolo de aniversário do sobrinho
refrigerante pipoca hambúrguer docinho de coco brigadeiro refrigerante jujubas
salgadinhos saideira de cerveja pipoca pizza sorvete bolo docinhos
Desenrola um bom pedaço do papel.
Cinco, sete vezes. Nenhuma sensação estranha. Não haveria segunda vez naquela
manhã. Pega do chão as roupas, veste a cueca, a bermuda, sobe o zíper, fecha o
cinto, veste a blusa polo azul. Vira-se para trás. Não pensou no trabalho do
funcionário que mais cedo havia limpado aquele espaço. Pensou na vergonha, teve
pudor, receio, refletiu moralmente, não cairia bem outra pessoa em suas
necessidades encontrar para própria surpresa um verdadeiro esgoto de merda na
privada. Puxa a cordinha. Desce para sua própria salvação a merda líquida.
Menos mal. Se fosse merda dura,
empedrada, correria o risco de entupir o banheiro, causando mais dor de cabeça
e sofrimento, teria de procurar a sala da limpeza, do lado de fora, pedir por
gentileza trouxessem um balde ou um desentupidor para desobstruir não precisa
não se incomode ele mesmo faria isso porque ele mesmo que produziu aquela merda
não não que isso estamos apenas fazendo nosso serviço não se envergonhe todos
os dias desentupimos merda de banheiro limpamos vômito e muitas coisas deixe
disso é coisa comum então está certo obrigado pela ajuda muito obrigado mesmo
depois eu pago um cafezinho que isso homem não precisa mesmo então está bem
muito obrigado mesmo
Repete o habitual ato comum de dar
a descarga. Abre a porta. Lava as mãos.
Apressa-se em sair. Precisava
conseguir se consultar com o clínico geral, precisava fazer os exames de
rotina, conseguir encaminhamento para o otorrinolaringologista.
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