Mais uma noite, mais uma história para dormir.
De costume, o filho deitado, enrolado no cobertor, olhinhos
ávidos por mais uma ficção e ao mesmo tempo sonolentos e semiabertos.
Sentado ao lado, mente atolada de compromissos e
responsabilidades, contas para pagar, mais contas que ainda fará, a mulher para
acariciar depois. Já de pijama também. Barriga cheia da janta. Estômago
sobrecarregado com bife de alcatra bem-passado, arroz, feijão e farofa, não
faltou o delicioso suco de maracujá, de uma marca barata. Mais que satisfeito. Solta
alguns arrotos, o filho sempre ri – não foi diferente.
Não foi diferente a história que contou. Sempre o mesmo
enredo, mesmos personagens, mas nunca se chega ao fim.
- Que tanto você faz aí nesse quarto? Vem logo!
Não dava ouvidos aos clamores da mulher. E começava sua
encantadora história. Estava André vagando pela rua à noite e viu um brilho
muito forte que parecia vir em sua direção. Ele era muito curioso e esperou o
brilho. Não era um brilho, mas um grande ser, com asas, uma espada, parecia um
anjo. E o anjo disse para André que, quando ele fosse adulto, ele teria um
filho que seria o maior orgulho da sua vida. Depois disso, o anjo sumiu e André
voltou para casa feliz e um pouco assustado pela aparição de um ser tão
iluminado e fantástico. Agora durma e amanhã continuaremos.
Deitou ao lado da mulher e se amaram como todas as noites. Após
o amor, cada um se vira para seu canto para sonharem e aproveitarem míseros
minutos de torpor e descanso e daqui a mais poucos minutos serem despertados
pelo despertador do celular com uma musiquinha irritante, própria para isso.
O dia é o mesmo para todos.
Chega a noite. Após o jantar, escova os dentes e vai ao
quarto.
- Vê se não demora! Quero terminar mais cedo essa noite,
ontem fiquei arrasada, não consegui nem acordar direito.
Está calor e o filho não está coberto, está com um short e
camiseta. Olhinhos semiabertos, ansioso pela continuação da história, pelo fim.
Senta-se ao lado, começa a narrar. André caminhava na praia, era fim de semana.
Reparou que algo na água se mexia, mas não era um peixe ou tubarão. Era muito
curioso e se jogou ao mar. Nadou, nadou, nadou. Era algo como um homem-peixe. Muito
estranho. E esse homem-peixe levou André para o fundo do mar para conhecer uma
pessoa.
Não fizeram amor esta noite.
Gabriel Sant’Ana
Muito bom!!!!
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