segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Depois do jantar, na cama



I


Depois do jantar, deitou-se na cama. O corpo estava mais pesado que os pensamentos. Um cansaço estranho dominava seus músculos, impedindo-o de coçar suas pernas.

A mosca zumbia irritantemente em seus ouvidos, mas não conseguiu levantar o braço para afastá-la.

A casa estava impecavelmente limpa, não havia razão de uma mosca na casa. Não comera em casa, o fogão estava sem panela alguma, na geladeira nenhum peixe, nenhuma carne.

Ziguezagueava zombando de sua incapacidade física para levantar-se e matá-la.


II


Entraram mais duas moscas no quarto. Continuava com o corpo pesando demais. Escurecia e aumentava o calor. A janela estava fechada. As moscas haviam entrado pelo banheiro. Nenhuma corrente de ar passava pela casa. Começava a suar. Estava de calça jeans e blusa polo preta.

Parecia que as moscas acasalavam.


III


Estava encharcado. O suor salgado escorria pelo seu rosto e percorria o caminho traçado pelas marcas de expressão. Já fazia uma pequena poça salgada nas bochechas.

Não conseguia pensar em nada. Os zumbidos das moscas e o seu acasalamento era insuportável, aterrorizante, obsceno, escatológico.

Uma das moscas pousou no retrato de uma amiga, que estava na mesinha no canto do quarto. Mexia as patinhas como se estivesse saboreando a pele da mulher.


IV

As moscas depositaram suas larvas nos seus olhos, na boca, nos ouvidos. Sugavam obsessivamente sua pele e seu suor.


Gabriel Sant'Ana


Um comentário:

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